quinta-feira, 22 de julho de 2010

Os borralhos de minha mãe


Quando menino minha mãe chamava-me de Alberto, devido a um ex-patrão dela e, que dizia adorar o nome. Eu então passei a ter além de Roberto e Marcelo, o nome de Alberto, eu era uma personagem de uma literatura real e minha mãe a escritora.

Sentia-me tão livre em cada nome, que me comportava como se tivesse 3 pseudônimos a me levar pelo sabor da vida. Minha mãe analfabeta, nascida no sertão pernambucano em 1928, tinha uma personalidade fantástica, autodidata, lia melhor que muitos que conheciam o alfabeto, vestia-se feito uma dama francesa da década de 30 ou 40 em plenos anos 1980, mas com um pensamento muito a frente de seu tempo. Carismática, feliz, mulher e humana.

Entre muito que aprendi com ela, sempre ouvia-lhe dizer: "Meu filho o céu de minha terra é de um azul intenso e belo, não feito este céu de sua terra, céu de borralho.", ou "você não quer ir com a mãe neste passeio" eu dizia que não queria, e ela me provocava dizendo: "então fique no borralho". Cresci ouvindo esta palavra.

Outro dia no trabalho, ouvi uma colega dizer:"meus filhos não param um minuto, parecem lagartixas quando caem no borralho!". Aquela palavra, mas aquela palavra, me lançou ao infinito, me senti o Alberto, trouxe minha mãe tão próxima de minha alma que podia senti-la a me olhar com um carinho profundo e sabedoria de quem sabe o que quer. Minha mãe Iraci, saudades que me chegaram aos olhos, ao coração, a me dizer sobre seus borralhos, que havia tanta vida em uma palavra sem importância, uma palavra que ela encontrava tantos sinônimos, que eu me perdia em tanta beleza, o borralho que não era só cinzas mornas, eram casas, céus, ruas, parques, distâncias, cidades e estrelas.

Minha velha mãe, um pouquinho de sua sabedoria continua em mim, me impulsiona a encontrar tantos sinônimos em uma só palavra, feito você.